Está cientificamente comprovado que todas as pessoas possuem um lugarzinho bem no meio da caixa torácica, uma fenda do lado do coração chamada dar fim. Até mesmo os céticos ficaram boquiabertos quando finalmente foi comprovada a funcionalidade de tal sítio.

Conta-se que as pesquisas foram iniciadas por um carpinteiro porto-riquenho depois que este perdeu a filha, em mil novecentos e tanto, de causas aparentemente desconhecidas. A moça era daquelas que saía no sereno e não ficava gripada, comia melancia de noite e a dor de cabeça nem dava as caras. Quebrante, não sabia o que era e se fartava de tudo o que era reimoso sem qualquer consequência. Que saúde...era o que diziam na rua quando passava.

O certo é que um dia a cabritinha caiu doente. Quedou-se tão mal que não comia, murchou que nem quiabo no fundo da gaveta. Pintura nas unhas e na boca já não usava. Em um fio de voz, ela conseguiu dizer ao pai antes de começar a diminuir: é o mal de dar fim, papai...Depois disso, todos os dias ela diminuía cerca de 5 centímetros. O carpinteiro, já desolado, assistia a tudo. Daí que ele perdeu a filha. Ela ficara tão pequenina que era impossível achar. Então, o homem prometera a si mesmo que descobriria o que era aquele mal de dar fim que dera fim a sua moça.

Deixou de mão a carpintaria para lidar com químicas e biologias. Fez da oficina um laboratório. Cheirava agora a papel e não mais madeira, o homem e o lugar. Os vizinhos lhe diziam que esquecesse aquilo, que era obra de Deus ou do Diabo, mas ele nada. Recebera notícias de casos semelhantes em Nokia (Finlândia), Santander (Espanha) e Ilha de Marajó (Brasil). Estava certo de que Deus ou o Capiroto tinham engenharias diferentes para sumir com as pessoas.

Em seus quatro últimos meses de vida, o homem nem saía mais do laboratório. Dia ou noite, a lâmpada nunca apagava. Imaginavam que ele estava lá a ler e formular teorias infinitamente. Coitado...Em uma manhã de agosto, o velhote da quitanda passava quando viu a antiga oficina às escuras. Logo soube que tinha algo errado e acionou a vizinhança. Não foi preciso muito esforço para derrubar a porta. Ele estava debruçado sobre a mesinha cheia de papéis. O rosto trazia uma expressão estática de triunfo absoluto. Na mão esquerda, um papel amassado com as constatações:

Dar fim é um vão ao lado do músculo cardíaco.
Funcionalidade: dar fim a toda ordem de sentimentos/opiniões que não queiram ser exprimidos. Em pleno funcionamento, tem a capacidade de garantir o autocontrole.
Características fisiológicas: 3 X 4cm com paredes extensíveis
Formato de fenda
Dar fim suporta um limite ainda não identificado de sentimentos. O preenchimento total da vão causa efeitos colaterais das mais diversas tipologias, inclusive o fim.

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