Primeiro foram os pratos. Dois quebravam-se de uma só vez a um simples deslocar de objetos dentro do armário da cozinha. Depois, os talheres. As colheres eram as primeiras a deseparecer sem vestígios, e então as facas e garfos. As xícaras também logo viraram cacos de vidro fugidos para debaixo das cadeiras.

Eles nem pareciam se importar muito. Acusavam-se mutuamente de descuido, desleixo e desatenção com os utensílios domésticos. Compravam novos e a durabilidade reduzia cada vez mais...

A decadência foi aos móveis da sala, às cadeiras da cozinha, aos azulejos do terraço, ao box do banheiro e aos estrados da cama. Que se pode lembrar, nada sobrou e eles ainda não ligavam. Ela, qualquer coisa mais melancólica, pusera a culpa desde cedo na má qualidade do que foi comprado. Ele esbravejava para parecer preocupado e, cinco minutos mais tarde, teria esquecido o problema. O fato é que a eles não parecia ser o que era.

Por último, foram os interruptores. Tomadas, extensões, o que fosse. Nada funcionava, talvez um curto circuito explodisse o último benjamim são, aquele amarelo. Fizesse o que se fizesse, a energia foi perdida. Mas aí eles já sabiam o que fazer, agora o reconheciam. Anunciava-se a tanto tempo, de tantas formas, porém não são todos que percebem a sutileza.

Então partiram os dois. Cada um sendo um só, sabendo que não existiam mais os dois. Passaram em silêncio pela última porta, que não fechava há meses, e sequer se olharam. Não havia mais o que ser dito, ou apontado, ou acusado, ou discutido. Estavam finalmente conscientes do fim.

Categories:

Leave a Reply